O que é a realidade? Aquilo que, de fato, existe ou a forma como o nosso cérebro processa os estímulos e informações que recebemos do meio externo?
Em geral, acreditamos que a realidade é exatamente o que percebemos. Mas, na verdade, cada um pode perceber de forma diferente a mesma “realidade” em função de como o cérebro processa e interpreta os diversos estímulos externos e internos. E uma informação ainda mais impactante: o nosso cérebro (o meu, o seu, o de qualquer pessoa), está preparado para nos enganar a todo momento! Vou explicar melhor isso…
O cérebro representa apenas 2 a 3% do nosso peso, mas consome aproximadamente 20% da nossa energia. Ou seja, é o órgão mais “gastão”, do nosso corpo. E, no processo evolutivo de nossa espécie, ele se desenvolveu buscando constantemente maneiras de economizar energia e evitar altas cargas de processamento mental.
Esse comportamento afeta diretamente nossos processos diários de tomada de decisão, que não são realizados de forma tão racional quanto acreditamos. Isso mesmo: como raciocinar, ou seja, pensar racionalmente ativando principalmente áreas do córtex frontal, demanda muito gasto de energia – em neurociência falamos de um “alto custo metabólico – em muitos casos, nossas decisões são baseadas em heurísticas, procedimentos que nos auxiliam a resolver um problema rapidamente. São atalhos cerebrais, julgamentos intuitivos que se baseiam no processamento da informação com conhecimento parcial, na experiência ou em suposições.
Importantes neste processo de “economizar energia”, as heurísticas, porém, podem nos levar a julgamentos e decisões incorretas. É quando se produzem os vieses – os erros sistemáticos que nos fazerem agir irracionalmente ou ter uma interpretação ilógica da realidade.
Existem mais de 200 tipos de heurísticas e vieses cognitivos na literatura científica e é complicado classificá-los. Mas as causas estão diretamente ligadas a alguns poucos fatores que dizem respeito ao processamento cerebral. Vou apresentar algumas destas causas e as principais consequências que podemos observar com muita frequência em nosso dia-a-dia.
O cérebro recebe do meio externo mais de 11 milhões de bits de informação por segundo e é impossível processar tudo isso. Conseguimos processar conscientemente apenas uma infinitésima parte: de 40 a 50 bits por segundo. Para ter uma ideia do que significa esta quantidade, é mais ou menos o que você está usando para ler este texto. Assim, se alguém falar ao seu lado ou você iniciar um diálogo interno, já se perderá no processamento do que está lendo!
Em função disso, o cérebro emprega atalhos mentais para selecionar apenas aquela informação considerada útil. Por exemplo: o cérebro se concentra mais em coisas associadas inconscientemente a conceitos que utilizamos com frequência, ou que utilizamos recentemente (heurística da disponibilidade). Por isso, quando pensamos em trocar de carro começamos a “ver” com uma frequência incrível aquele modelo que cogitamos adquirir.
O cérebro também concentra a atenção no que confirma nossas opiniões e crenças e ignora coisas que nos contradizem (viés de confirmação). Ou seja, temos a tendência de dar muito mais credibilidade ao que está alinhado ao que já pensamos, e isso nos faz valorizar mais a informação que venha a confirmar o que acreditamos. E isso é constantemente potencializado, construindo a dificuldade de mudarmos de opinião sobre um determinado fato ou situação, mesmo que errados!
Como processamos apenas uma pequena parte das informações necessárias para uma visão completa da situação, o cérebro preenche as lacunas para dar sentido ao que está ao nosso redor. O cérebro encontra histórias e padrões até em dados dispersos (ilusão em série ou apofenia), o que é natural para evitar a sensação de estranhamento, de algo que não gostamos ou que nos deixa inseguros. É por isso que encontramos formas nas nuvens e lógica em eventos totalmente aleatórios, como a sequência de números de uma loteria.
O cérebro dá mais valor às pessoas ou coisas com as quais gostamos ou estamos acostumados (efeito familiaridade). Em outras palavras, incluímos suposições sobre o que vemos. Por exemplo, normalmente pensamos que pessoas atraentes são mais inteligentes e gentis do que pessoas menos atraentes porque generalizamos uma característica positiva para todas as outras (efeito halo).
Estes são apenas alguns exemplos derivados das heurísticas e vieses. Mas como a página está acabando, vamos ficando por aqui hoje. Mas reforço: entender por que o nosso cérebro funciona assim é o ponto de partida para melhorarmos as nossas decisões e obter mais sucesso em nossa vida pessoal e profissional.
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