NECESSIDADE, VONTADE E CORAGEM: UMA TRÍADE PARA A AÇÃO

NECESSIDADE, VONTADE E CORAGEM: UMA TRÍADE PARA A AÇÃO

Procrastinar é da natureza humana. Mas, conhecendo a sua origem, podemos combatê-la!

 

Nós, humanos, temos a característica natural de nos mantermos em uma situação confortável, comumente chamada de “zona de conforto”. A origem deste fato, remonta à forma como nosso cérebro evoluiu – procurando sempre economizar energia – e das diversas funções homeostáticas do nosso organismo, ou seja, de buscar sempre o equilíbrio e condições constantes. Portanto, para que algo aconteça, é necessário suplantar estas condições naturais.

Entendo que, uma vez entendendo a origem do fato, temos maiores condições para atuar sobre ele. Assim vejo a questão da procrastinação, em bom português, o bem conhecido “empurrar com a barriga”. E, vale aqui um pequeno comentário: este fato acontece em diversos níveis, desde aqueles “cinco minutinhos” a mais na cama pela manhã, até deixar para depois atividades pessoais ou profissionais que estão ligados com grandes projetos ou objetivos.

Há muito tempo estudo as questões relacionadas à produtividade e gestão do tempo, desenvolvo treinamentos e realizo mentorias na área. E a procrastinação é um dos tópicos mais presentes neste trabalho, entretanto, não é um ponto simples de abordar. Como todo grande problema, ou problema grande, uma primeira técnica que podemos utilizar é desdobrá-lo em problemas menores – a velha técnica do Jack! Daí eu ter desenvolvido uma ferramenta que permite analisarmos a procrastinação em três pontos: uma tríade.

Cada aspecto está relacionado com uma parte do nosso cérebro. A relação de cada uma delas com a situação que estamos procrastinando, permite identificarmos qual o ponto crítico que precisa ser tratado. E aí, focando nossa energia neste ponto, conseguimos potencializar a nossa capacidade de vencer a barreira criada pela procrastinação.

Vamos ver, então, os componentes desta tríade: a necessidade, a vontade e a coragem; a sua origem e como podemos utilizá-la para combater a procrastinação.

 

A ORIGEM

 

A relação entre necessidade, vontade e coragem com a ativação de diversas áreas do cérebro humano envolve uma complexa interação de circuitos neurais e neurotransmissores. Vamos explorar cada um desses elementos e suas respectivas influências no cérebro:

 

  1. Necessidade: 

A necessidade é uma condição interna do organismo que requer satisfação para garantir a sobrevivência e o bem-estar. Quando o cérebro percebe uma necessidade, como fome, sede, sono ou até mesmo necessidades emocionais, como a busca por conexões sociais, regiões específicas do cérebro são ativadas. 

Boa parte das necessidades estão relacionadas à sobrevivência e a preservação da espécie. As reações perante elas, são instintivas, ou seja, ativadas pelo tronco encefálico e o cerebelo. São irracionais e inconscientes, e são grandemente responsáveis pelo nosso processo de decisão. O perfeito entendimento de uma necessidade, buscando a sua real origem, é de extrema importância!

 

  1. Vontade: 

A vontade é a capacidade de tomar decisões e agir em direção a objetivos e desejos. A regulação da vontade está relacionada a áreas do cérebro responsáveis pelo controle executivo, como o córtex pré-frontal, que é crucial para o planejamento, tomada de decisões, inibição de respostas impulsivas e perseverança em face a desafios.

Quando alguém tem uma forte vontade de alcançar um objetivo, essas regiões do cérebro envolvidas no controle executivo são ativadas, permitindo que a pessoa formule planos e execute ações para atingir seus objetivos. Porém, falar de “forte vontade” inclui o balanço entre o nível de ativação do sistema de recompensas (o que ganho com isso) e o sistema de aversão a perdas (o que perco ou deixo de ganhar com isso).

 

  1. Coragem: 

A coragem é a disposição para enfrentar situações desafiadoras ou ameaçadoras, apesar do medo ou da ansiedade. A experiência da coragem está associada a uma interação complexa entre o sistema límbico-  que inclui estruturas como o hipotálamo e a amígdala, é responsável pelas emoções e respostas emocionais – e o córtex pré-frontal. 

A amígdala, por exemplo, desempenha um papel fundamental na resposta ao medo e na avaliação do perigo. Já o córtex pré-frontal atua na regulação emocional e no controle das respostas do sistema límbico. Quando alguém enfrenta uma situação desafiadora que exige coragem, o cérebro precisa balancear a resposta emocional da amígdala com a regulação do córtex pré-frontal para controlar o medo e permitir a ação corajosa.

 

A ANÁLISE

 

Para realizarmos determinada ação, os três aspectos citados (consequentemente as ativações cerebrais correspondentes) devem “estar on”. Se um deles faltar, nada acontece.

Por exemplo, se não identificarmos a necessidade da ação, ficaremos parado. Se identificamos a necessidade, mas não tivermos vontade (desejo) suficiente para supri-la, ficaremos parado. Se identificarmos a necessidade, tivermos vontade de supri-la, mas não tivermos coragem para nos colocar em ação, não faremos nada! Então precisamos identificar em que nível estamos. Qual aspecto que está sendo o limitante para a nossa ação.

 

Passo 1 

Começamos analisando a necessidade. A necessidade está diretamente ligada com o porquê da ação. Daí a minha sugestão de sempre começar a análise por ela. Dois aspectos podem ser abordados: qual a necessidade real e qual a pressão temporal sobre esta necessidade.

Para destacar a real necessidade, a técnica que eu normalmente utilizo é a dos “cinco porquês”. Ela é muito simples: pergunte-se “Por que eu preciso fazer tal coisa?” Não se contente com a resposta e pergunte-se: “Por que eu preciso [a resposta da pergunta anterior]?”. Não pare por aí, repita mais duas ou três vezes esta pergunta. Aí você chegará no verdadeiro motivo. Você encontrará, portanto, a motivação!

O outro aspecto diz respeito à questão temporal. A necessidade tende a aumentar com o passar do tempo. Mesmo se tratando de uma questão importante, se não há uma pressão temporal, nosso “sistema de conforto” fará com que avaliemos a necessidade com baixa intensidade. Porém, à medida que o tempo passa, aumenta a urgência da execução da tarefa e, consequentemente, nossa avaliação vai aumentando.

Um exemplo bem simples: o despertador tocou e você acionou o modo soneca (você tem mais cinco minutos). Se ainda falta uma hora para você ter que sair de casa, neste momento, o nível de urgência é baixo, reproduzindo-se em uma baixa avaliação da necessidade de se levantar da cama. Entretanto, após três ou quatro acionamentos, o horário para sair de casa se aproxima (urgência aumenta) e a necessidade de levantar se torna mais premente.

 

Passo 2

Como está a sua vontade? O quão disposto você está em se colocar em ação? O ponto chave é identificar o quanto o sistema de recompensa está ativado!

Perguntas que devemos nos fazer: “O que eu ganho com isso?” “Qual vai ser a nova situação após agir?” “De que forma o resultado me fará mais feliz ou que prazer ele me trará?”

Estas perguntas são de extrema importância para criar mentalmente a situação futura. Como nosso cérebro não distingue o que é real do que é imaginário, esta visualização é suficiente para gerar dopamina, neurotransmissor do prazer, e ativar as áreas de recompensa. Na integração posterior no córtex, este efeito será entendido como “vontade de fazer” para alcançar o prazer projetado.

Uma técnica que também ajuda, é gerar recompensas para aquelas atividades que por si só não geram suficiente dopamina para serem realizadas. Aí podemos oferecer a nós mesmo algo que nos dê prazer. Por exemplo, mesmo não estando com uma enorme vontade de terminar de escrever este artigo, me prometi uma boa taça de vinho ao terminá-lo! Então, vamos lá….

 

Passo 3

Agora é só potencializar a coragem! Ou, outra forma de dizer, controlar o medo e a sensação de perda que ativam as estruturas como a amígdala cerebral. O medo trava, e a sensação de perda, se maior do que o benefício percebido, será integrado como uma resposta negativa no córtex, em outras palavras, a “não ação”.

Um amigo meu frequentemente diz: “tá com medo, vai com medo mesmo…”. A chave aí é identificar a verdadeira origem deste medo, separando o que é real do que é imaginário. Muitos de nossos medos não são reais. Eles partem de suposições que muitas vezes são pouco prováveis. Aí indico as seguintes perguntas chave: “Qual a probabilidade disto acontecer (lembrando que probabilidade é matemática e ativa as regiões analíticas)?” “E, se por um acaso, acontecer, qual é a pior coisa que pode acontecer?” “Qual o pior efeito que isso pode gerar?” Normalmente, não é nenhuma catástrofe…

 

A CONCLUSÃO

 

Após ponderar separadamente cada um dos componentes da tríade, agora podemos fazer a integração das avaliações. Você pode dar notas de zero a dez para cada um dos pontos. Aí a primeira questão é: qual o aspecto que está com a nota mais baixa? Aja sobre ele prioritariamente! Questione-se e crie dos gatilhos necessários para aumentar a pontuação desse aspecto.

Se todos os aspectos estão em nível semelhante de ativação, priorize a ordem: necessidade, vontade, coragem.

Este é um exercício constante. E, como todo exercício, a prática leva a perfeição. Com o uso desta tríade, você vai conhecer melhor as suas características de reação. Conhecendo-se melhor, você vai apurando os seus questionamentos. Consequentemente, você vai dominando cada vez melhor as suas ações, tornado este processo automático.

Ah! Depois de se autodesenvolver, de dominar a ferramenta, não hesite em utilizá-la em seus pares, equipes e em outras situações que envolvem outras pessoas. 

Grande abraço e SUCESS😊!!!
Prof. Álvaro Flores